LÍRIOS QUE NÃO MURCHAM

Numa bela manhã de sol ardente,
Cantam melros, perto, num limoeiro.
Que pena tu não estares presente:
Há lírios nas águas do ribeiro!

Colhi uns, pla saudade que me deste,
E dei-tos numa linda jarra d' ouro.
Pelo bem que na vida me fizeste,
Quero que fiques com este tesouro!

E quando, na nossa casa, os vejo
Dou-lhes sempre um demorado beijo
E fico em ti sempre a pensar...

É qu' adivinham os lírios do rio
Que te dei minha vida - sentem brio!
Beijo-os sempre, sem nunca murchar!

Modesto

PAISAGENS DO DOURO

Plas margens do meu Douro de águas claras,
Ando em viagem constante, sem descanso.
Vejo as paisagens que me são tão caras,
Admiro-as com prazer, nunca me canso!

É por elas qu' eu gosto de escrever:
Troco meus afectos e felicidade,
Até esqueço qu' um dia vou morrer...
Mas sei que nunca morrerei de saudade!

Tem flores, tem sol... e aves a voar!
Lá, Hinos de amor costumo entoar,
Consagrando meu tempo qu' é sempre novo.

Por lá, há luz, inspiração sem medida,
Perfume que dá vida à minha vida...
Agradeço a Deus - Aqui me renovo!

Modesto

PAISAGENS DE AGOSTO

Paira o silêncio na folhagem,
As árvores tecem amor antigo,
Sobressalto vindo duma aragem
Qu' ao dia solarengo dá abrigo.

O coração, qu' é sombra na paisagem,
Dá às palavras vãs outro sentido:
Um murmúrio feito de passagem...
Ao entardecer, procura abrigo.

Ares assim fazem-se duma luz
Qu' o coração ao extremo reduz,
Com´o dia se dissolve, ausente.

Acolhem-se as palavras devagar,
Num dia, em fulgor, que nos vai dar
Vermelho crepúsculo no poente!

Modesto

TARDE DE VERÃO

Fim de tarde, no campo da aldeia,
É tarde de Verão, iluminada.
Vem a família e gente alheia,
Par' a sombra da frondosa ramada.

Gente alegre, parece uma colmeia!
Surgem copos d' água com limonada!
Vem mais gente - mágica assembleia!
É a vizinhança aglomerada.

Da torre da igreja soa o sino,
Som que se junt' aos risos, com'um hino
Elevado ao céu, em pia prece.

Finda mais um dia alegre, quente.
Cansada a 'sfera incandescente
Cai por trás dos montes e adormece!

Modesto

O SONHO REAL

É a luz que em nós mora em cada dia,
Sentir humano que nos enche d' esperança,
É o amor declamado, é poesia,
É alegria nos risos duma criança.

É o int'rior a saltar pró ext'rior,
É sentimento que esconde o sofrer,
É um ponto onde existe muita dor,,,
- A Verdade que não se consegue 'sconder.

É um viver nos bons sonhos, é alegria,
Amor cantado pela nobre poesia,
É amor dos amantes e dos seus amores.

Não se pode sofrer n' ilusão doentia,
Porque ninguém se engana nem há rancores...
- Sonho é horizonte de jardins com flores!

Modesto

APROXIMAR-SE DO CÉU

Temos, todos que vivemos,
Uma vida qu' é vivida,
Outra vida qu' é pensada.
Mas a única que temos
É a que é dividida
Entr' a nossa e a doada.

É difícil entender
Qu' existe um amor doado:
Mas é o amor maior,
Sem esperar receber
Amor para ser amado,
Mas of'recer uma flor.

Amor é doar, fazer
Tudo o qu' é essencial,
Louvand' o qu' o outro faz:
É amor maior do ser!
Não deixar que faça mal,
Viver com outro na paz!

Modesto

SONHEI ACORDADO

Acordado, naquela madrugada,
Eu revivi um facto fabuloso:
Era tão real! Sobre a montada,
Voava num cavalo tão fogoso...

Cavalguei pela "Terra de Ninguém",
Harmonizada com a Natureza::
Campos ondulados, fauna de bem,
Tons azulados cheios de beleza!

Um lindo horizonte d' azul forte,
Uma suave abóbada celeste,
O trote do meu cavalo da sorte...
Davam ritmo à música campestre!

A solidão era 'spiritual,
Recordações gravadas na memória!...
Vivia um tempo especial
Que, por isso, me levou à vitória.

Eram tempos lindos - oh! Que saudade!
Havia harmonia na Natureza,
Amava-se tod' a humanidade,
Com bem-estar... tudo pureza!

Modesto

A EXISTÊNCIA DOENTE

Hoje 'inda sinto uma tristeza vaga
Que pesa sobre mim como férreo jugo:
Sinistro sofrer que me sufoca, esmaga,
Como laço fatal d' invisível verdugo.

Sim! Às vezes, não sei fugir ao desalento
Que vem sobre mim, qual nuvem tempestuosa!
Não posso desviar o curso ao pensamento
Que desce sem parar em senda tenebrosa.

Se olho o porvir, vejo-o tão escuro,
Como se no céu se formasse tempestade,
À volta do mundo que voga mal seguro:
Uma nuvem densa o espaço invade!

Saud' o futuro como risonh' aurora
Que tinge os montes de purpurina cor!
Saud' o futuro com voz consoladora:
Mas vivermos uma época melhor?

Modesto

FÉRIAS NA ALDEIA

Já se deitam as estrelas,
A lua vai atrás delas.
Ao longe, o sol desponta
E os seus raios trasmonta,
Ilumina as serranias,
A luz traz-me alegrias,
Prá manhã de arrebol
Clara, cheia de sol.
E, aqui, na minha aldeia
Já s' apagou a candeia,
Pois já há claridade!
E, eu cheio de saudade,
Corro pelos campos fora,
Pisando a bela flora...
Corro cheio d' esperança
De encontrar a criança
Que, em tempos idos, fora.
Tenho saudades agora!
Dou vivas à liberdade
Que sentia ness' idade
E me fazia feliz!
Tenho qu' ir ver o que fiz
Nesses tempos de pastor:
Ia por serras de cor,
Bebia água da fonte,
Vislumbrava o horizonte...
E tinha como tesouro:
Minha serra e meu Douro!

Modesto

RECOMEÇAR SEMPRE

Quando pensamos no crepúsculo,
Lembramos uma noite de terror,
Negritude ou melancolia
E ficamos ensombrados
Pela dor, medo,desgosto
E sensação de impotência,
Como se a vida se esvaísse
Em cinzento...
Esquecemos que a noite
Corre para a madrugada:
Quebra-se a escuridão
E a aurora traz-nos novamente
Uma vida brilhante e colorida.
Nos momentos tranquilos,
Há um sonho mítico
Em que se vê uma montanha
Íngreme com o cume dourado:
Um cume escarpado,
Mas iluminado
Pelo sol.
É um lugar de refúgio,
Se tivermos a coragem
De pedir ao Guia da vida
Confiança, para que nossos pés
Encontrem de novo o caminho,
Libertando-nos do passado
E abraçando o futuro.
Aquele sonho põe-nos
Em frente da montanha
Cheia de sombras...
Mas, há sempre um carreiro iluminado
Que atravessa as planícies
Cobertas de flores
Que nos encoraja a escalar
A montanha rochosa.
O sol da nova madrugada
Eleva-se acima do cume
Brilhante da montanha
Que encerra uma promessa
De coisas boas no futuro,
Se tivermos fé e coragem
Para lutar
E continuar a escalar a montanha.

Modesto