quinta-feira, 30 de julho de 2020
SENDA
Meti-me no casulo desta vida
Quando por fora havia tanta luz!
Minha estrada ficou escurecida,
Meu Tabor transformado em cruz.
Das lágrimas fiz versos comoventes
Que talvez alguns leram, comovidos!...
É bem triste levar por entre as gentes
A alma presa a sonhos doloridos.
A vida sem um fim não tem sentido.
O jardim sem as rosas é despido.
Amor sem se viver nunca dá gosto...
As músicas das aves são agrestes,
Os roseirais da infância são ciprestes,
A aurora sem luz é já sol-posto...
Modesto
sábado, 25 de julho de 2020
QUANDO O MAR BAIXA
Quando o mar baixa, todos os rochedos
Me 'spreitam como vítima a abater.
E eu, já sem ousadias e sem medos,
Cruzo os braços, disponho-m' a perder.
Sem tábua de salvar, afrouxo os dedos,
Não penso, fecho os olhos pra não ver
Os picos aguçados dos fraguedos
Sabendo, embora, quanto vou sofrer.
Talvez que a maré alta vá voltar,
Trazer-m' o esquecimento, afogar mágoas
E encher o mar com mais serenas águas...
Talvez venham umas ondas de remanso...
Pois, nas marés da vida, o meu balanço
É positivo... E não há volta a dar!
Modesto.
segunda-feira, 20 de julho de 2020
PÉTALAS
Meus anos, pétalas belas
De uma rosa perfumada,
O aroma qu' havia nelas
Perfumou a minha estrada.
Pétalas brancas eu pus
Na sala da minha casa,
Lembravam a meiga luz
Ou a cor d' alguma asa.
Já na minha mocidade,
São pétalas de saudade
E perfume de primeira.
Porqu' as pétalas amava,
Na Primavera enxertava
Uma viçosa roseira.
Modesto
sábado, 18 de julho de 2020
HÁ MILAGRES, SIM!
"Não há milagres - dizes peremptóro -
Tudo s' explica, há sempre uma razão
Por trás das coisas... Nada é ilusório
Como a fé de qualquer religião!"
E nada mais a dizer. Pois é notório,
Nunca irás mudar de opinião.
Argumentar contigo, acto inglório,
Põe-se ponto final na discussão.
Mudamos, pois, de assunto. Mas no fundo
Mantenho a mesma crença decidida,
Pois não abandono as minhas ideias...
Mas milagres há, embora tu não creias!
- O milagre maior é a própria vida
Que brota, de mil formas, sobre o mundo.
Modesto
sábado, 11 de julho de 2020
O LAGO
Havia ao fundo da campina um lago,
Num prado cristalino, arredondado,
Dentro escondia um mistério vago,
Oculto para o céu imaculado.
O próprio cisne que desliza e passa
Sereno sobre as águas de cristal...
Talvez pense que a água não é baça
E que tem a pureza original.
O lago imenso faz-me recordar
O choro dessa gente amargurada;
Muitas das lágrimas são do meu chorar:
É o sal da minha vida já cansada.
Abundam muitos lagos na paisagem,
Nesta humana paisagem de utopia;
D' alegria ou tristeza são mensagem
Dos olhos dos que choram noite e dia.
Modesto
terça-feira, 7 de julho de 2020
VOLTEANDO
Tantos modos de dizer
Muitos mais a inventar...
Quem sonetos quer fazer
Tem que muito bem pensar.
Regras firmes aprender,
Com empenho as aplicar,
Um fado triste sofrer,
Atento, musa 'scutar.
O Camões e a Florbela...
Com fados tão inditosos
Como não houve jamais!
Foi a sina dele e dela...
Com sonetos primorosos
Os fizeram imortais!
Modesto
quinta-feira, 2 de julho de 2020
QUEM ME DERA
Quem me dera ser a flor mais simples do jardim,
Sorver o sol e poder irradiar, a quem lá vem,
O meu perfume de tojo, de acácia ou de alecrim,
Enleando inquieto o meu olhar com esse alguém!
Quem me dera ser o verde apenas de uma erva,
Ser o miolo tosco ou a migalha do meu pão,
O filamento que se abandona, estica, e se enerva!
Quem me dera ser apenas o cheirinho do limão!
Quem me dera poder parar, sorrir e estremecer
Pelo suco erguido desses botões com que me olhas
E ser sempre o número certo em todas as escolhas!
Quem me dera esse balanço de ser e de não ser,
Em cada gota de orvalho colorido de esperança!
Quem me dera ser suspiro, ser tudo e ser criança!
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